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Tentar
convencer um empresário com papos conceituais
não funciona simplesmente porque não é
a linguagem dos caras."
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Demanda, evolução e mercado
Mensagem original
enviada em: 07 fevereiro 2002
Assunto original:
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Antes
dos anos 90, o design era dominado pelas agências de
publicidade, e quando o cara criava a identidade visual dele
numa dessas empresas já era visando campanha, ou seja,
design era um meio e não um fim em si. A idéia
da pura identidade empresarial ainda era difusa. Naquela época
também, design era algo trabalhado por profissionais
de criação pura e os layouts eram executados
por arte-finalistas em suas mesas de trabalho com nanquin,
tira linhas, curvas francesas e um monte de outras traquitanas.
Ou seja, só uma elite (e põe elite nisso) trabalhava
diretamente com o design e o consumia: a elite dos profissionais
de criação, em sua maioria com formação
ou cursos de extensão no exterior, a elite dos arte-finalistas,
pessoas que tinham que aliar seu talento com uma puta capacidade
técnica de dominar toda aquela equipamentária
e a elite de clientes que pagavam por publicidade.
Nos anos 90 viaram essas maquininhas que estamos usando nesse
momento para escrever essas mensagens e trocar informação.
Então, a necessidade técnica imensa que o antigo
arte-finalista tinha que ter pra trabalhar, caiu. Hoje conheço
muitos designers que, se você der um papel e uma caneta
na mão deles, não sai absolutamente uma linha
boa que seja e ainda assim são puta designers!
O que isso quer dizer? Pessoas que tinham talento para a
coisa puderam exercer o ofício, pois não necessitavam
mais da habilidade manual (ainda estou falando da arte-final,
ok?) e das ferramentas que na época eram caras (é
só vocês verem nas papelarias, pra montar um
escritório de design a moda antiga gasta-se mais do
que comprando um computador), tenham certeza de que muitos
de nós não estaríamos nesse lance se
não fosse essa "revolução"
(não é uma revolução de verdade,
por isso vai entre aspas). Outra consequência é
que o profissional de criação pura, fundiu-se
com o técnico na hora da execução do
trabalho e para os poucos profissionais de criação
pura que ainda existem ficam os operadores (o profissional
técnico de hoje, que necessita de bem menos formação
do que antes, afinal, qualquer um opera Corel ou o que quer
que seja, mas uma minoria manipula decentemente uma caneta
de nanquin).
Resultado final? Febre. A febre de design que começou
nos anos 90 e está eclodindo até hoje. Eu fiquei
espantado porque outro dia vi um desses cadernos de vestibular
e vi que a proporção candidato/vaga para as
cadeiras de design nas faculdade cresceu imensamente. Quando
eu fiz para PV (Programação Visual) na UFRJ
era barato de 9 ou 12 candidatos por vaga e hoje bate fácil
30 ou 40 candidatos por vaga. É quase tão popular
quanto direito, medicina, publicidade e essas faculdades mais
notórias. Como eu disse, muitos bons designers existem
hoje graças a esse cenário; designers estes
que iriam vender sapatos ou ter qualquer outra profissão
em tempos passados, mas nem tudo são flores.
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A tal
'cultura em design' não vai vir de dentro para
fora. Essa cultura vai vir de fora pra dentro: o mercado
vai perceber o que é bom e o que não."
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Esse inchaço de mercado, que trouxe gente boa e gente
ruim (normal isso) veio acompanhando a demanda. Ter design
passou a ser diferencial, as empresas passaram a procurar
esse serviço justamente porque, com os computadores,
ele ficou mais viável financeiramente pro pequeno e
pro médio empreendimento. Nesse estado inicial da coisa,
o importante é ter design, onde design significa que
você, empresário, pagou alguém pra fazer
uma marca pra ti e ponto final. O resultado é esse
que assistimos, coisas boas que antes não seriam viáveis,
coisas médias e coisas hediondas feitas muitas vezes
por escritórios reconhecidos de design e por aí
vai. O bom e o ruim aparecem indiferente da origem.
Vivo falando isso aqui: já vi muito designer "profissa",
desses que cagam goma pra sua formação, conceituais
e estudos pra no final fazer merda enquanto micreiros despretenciosos,
chegam e tem boas sacadas vez ou outra. Tirando fora o mérito
sobre os trabalhos e analizando isso mais como mercado está
tudo dentro do normal. Design é um estudo que não
tem nem um século direito; estourou junto com a sociedade
imagética que vivemos hoje em dia e nesse caos de informação
rola de tudo. Mas os fatos são que hoje em dia é
mais fácil fazer design do que antes e é mais
barato consumir design do que antes, isso faz com que o mercado
consuma mais design do que antes e tenha mais profissionais
que antes.
Olhando pra fente e comparando o fenômeno com outros
do mesmo tipo o que podemos especular é: uma hora o
mercado vai saturar. Todas as empresas já terão
"design"; todo mundo terá uma identidade
visual projetada por um designer, indiferente se custou R$ 1,99
ou mil dinheiros, mas terá. Aí vão surgir
novos diferenciais que não apenas o design. Na minha
opinião, a tendência é que o diferencial
passe a ser o "bom design", onde "bom"
se lê como funcional. Os empresários, que são
os nossos consumidores, vão poder comparar, calcular
o custo/benefício e chegar a conclusões do tipo
"é: vale a pena pagar bem por uma identidade porque
essa que eu fiz com o meu sobrinho não está
dando tanto resultado quanto aquela que fulano fez com aquele
bom rapaz que estudou design".
Antes disso, tentar convencer um empresário com papos
conceituais não funciona simplesmente porque não
é a linguagem dos caras. Tem que rolar números
para chegar e argumentar e esses números ainda vão
acontecer. O que se tem hoje é pouco e se aplica muito
mais a grandes projetos de brand marketing. Se eu chegar com
isso pra um micro empresário, por exemplo, ele na hora
vai falar algo como "eu não sou a Shell"
e ele estará certo mas eu ainda não tenho como
provar a funcionalidade do design em pequena e média
escala, mas vou poder.
Não sei se ficou claro mas penso em algo assim, a
tal "cultura em design" não vai vir de dentro
para fora, com um grupo de designers messiânicos que
vão peregrinar pelo mundo pregando como design é
bom, engorda e faz crescer. Creio que essa cultura vai vir
de fora pra dentro, ou seja, o mercado vai perceber o que
é bom e o que não é e só vai ficar
aqueles que realmente se preocupam com esse tal design, que
o estudam, coisa e tal. Para o mercado perceber isso vai ter
que ter a fase que passamos agora, ela está aí
para gerar os parâmetros que vão reger o mercado
daqui a um tempo.
Sei lá, algo assim...
Dúvida e discordâncias por favor.
Romulo Marques
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