
"Falar em marca não é apenas
referir-se ao plano físico mas sobretudo ao mundo simbólico
coletivo, de passível construção e reconstrução
a cada instante" |
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A juventude da disciplina do
design e o fato desta ter surgido de fora para dentro das
empresas, contrariamente ao marketing, será uma das
razões pela qual o desenvolvimento e gestão
da marca aparecem normalmente como competências deste
último. Porém, embora como refere Wally Olins
(1995, p. 7) [1›],
o termo imagem corporativa surgiu apenas na década
de 1950 usado por "Walter Margulies, chefe da distinta
consultoria de Nova Yorke Lippincott & Margulies".
É de conhecimento público que o primeiro projeto
de identidade corporativa tal como hoje é entendido,
surgiu pelas mãos de Peter Behrens e Otto Neurath em
1908 na AEG, onde desenvolveram um programa completo constituído
por projectos de edifícios, fábricas, oficinas,
estabelecimentos comerciais, produtos, lâmpadas industriais,
serviços de chá, logotipos, cartazes, folhetos,
anúncios publicitários, catálogos etc.,
relacionados por um mesmo conceito corporativo.
Na opinião de Joan Costa (2004, p. 101)
[2›], o termo "identidade
corporativa" terá sido criado nos Estados Unidos,
com base em projectos como o da AEG, mas adotando uma perspectiva
mais redutora, confinada apenas aos aspectos gráficos,
eventualmente por ser mais fácil de comercializar e
assim se terá generalizado.
Erradamente, mesmo os próprios designers tendem a
confinar o seu trabalho apenas aos aspectos gráficos
da marca, esquecendo que dessa forma apenas resolvem parte
do problema, negando as suas capacidades e responsabilidades
enquanto estrategistas, importantes para o sucesso da empresa
e de qualquer marca.
Uma marca vive sobretudo de comunicações da
empresa para com o seu público, cuja experiência
de uso do produto ou serviço deve ser a melhor e a
mais diferenciadora possível. Afinal, a marca contemporânea
assenta na sociedade da informação e por isso
são as empresas que têm de se adaptar a um cliente
cada vez mais exigente, informado e com necessidades essenciais
satisfeitas.
Norberto Chaves refere que a empresa contemporânea
é um centro semiótico corporativo, emissor e
receptor de mensagens que formam sistemas de signos (mensagens
com significado) que procuram criar valor no serviço
ao cliente. Ou seja, de todos os contatos do cliente com a
empresa, resultam mensagens veiculadas propositadamente, como
são exemplos discursos verbais ou escritos da direção,
web site, folhetos, a marca gráfica e outros
objetos institucionais, mas também indiretamente como
o aspecto do edifício, a aparência dos empregados
e a sua prestação ou a qualidade do serviço
ou produto. O cliente recolhe as informações
disponíveis dependendo dos contatos que tem com a empresa,
produto e serviço, decodificando as mensagens por comparação
com a concorrência e com o nível da sua própria
experiência ou satisfação. Assim, forma-se
uma opinião ou imagem mental da marca, um mundo simbólico
construído pelo destinatário ou cliente e que
pode ser comum a um grupo. A grande questão passa a
ser como controlar a construção do mundo simbólico
coletivo? E a resposta apenas pode ser: garantindo que as
mensagens, direta e indiretamente transmitidas, devem verbalmente
e visualmente ser coerentes ao nível semântico
e da retórica (aplicação), para que a
intenção (desígnio) seja apreendida dessa
forma (decodificação).

Assim, falar em imagem de marca é referir-se em simultâneo
a duas dimensões distintas mas complementares. A imagem
corporativa refere-se a uma análise feita pelos públicos,
que resulta de todos os dados provenientes da organização
(podendo dar azo a diferentes interpretações
ou imagens).
Confundem-se imagens visuais (eikon) com as imagens mentais
ou da imaginação (imago). "Imagem gráfica
não é identidade corporativa, ainda que esteja
generalizado considerá-la enquanto tal… graficamente
apenas, não se constrói a imagem nem a identidade
corporativa, mas simplesmente a identidade gráfica,
que contribui para a construção da imagem corporativa".
(Joan Costa, 2004.) [3›]
Resumidamente, imagem de marca ou imagem corporativa diz respeito
a uma opinião ou imagem mental sustentada por um grupo
(podem existir diversas imagens de marca, dependendo da percepção
de diferentes grupos); é o mesmo que falar em reputação
corporativa.

A identidade corporativa refere-se à personalidade
e cultura da empresa, à visão interna do staff
sobre a própria organização. Assim sendo,
é fácil compreender que para alterar o posicionamento
ou revitalizar uma marca não basta alterar o seu componente
visual, mas implica repensar a própria forma de negociar
e de todo o processo necessário a disponibilizar o
produto ou serviço, pois cada componente da empresa
comunica por si e contribui para a imagem mental ou mundo
simbólico coletivo – a marca.
Falar em marca não é apenas referir-se ao plano
físico (onde está a marca gráfica) mas
sobretudo ao mundo simbólico coletivo, de passível
construção e reconstrução a cada
instante, dependendo das mensagens que resultam da empresa,
produto ou serviço. Assim sendo, o grande esforço
das empresas vai no sentido de disponibilizar a melhor experiência
de uso possível ao cliente, através de argumentos
lógicos (qualidade preço, função
etc.) e emocionais (apelo à sensação,
ao prazer ou status etc.).
A teoria de motivação de Abraham Maslow (1992)
refere que as necessidades humanas obedecem à uma hierarquia
ou escala de valores onde sempre que uma necessidade é
satisfeita, aparece uma nova (que deve ser satisfeita) e,
quando não é suprimida, é substituída
ou transferida (na base estão as necessidades fisiológicas
e no topo as de auto realização). Um dado importante
para compreender porque as marcas contemporâneas mudam
os seus argumentos lógicos para emocionais.
Na verdade, as marcas atuais compreenderam que uma grande
maioria dos clientes têm as suas necessidades fisiológicas
satisfeitas e procuram algo que os satisfaça pelo prazer
da experiência. É neste ponto que se mede o valor
acrescentado e o ponto de diferenciação. Para
Wally Olins (1995, p. 10) o valor acrescentado que permite
a diferenciação de uma empresa relativamente
aos seus concorrentes, prende-se com a relação
emocional que se estabelece com o consumidor, fazendo-o com
argumentos lógicos e emotivos. Opinião partilhada
por José M. Martins (1999, p. 12)
[3›], para quem abordar
a questão da marca é falar em emoções,
pelo que no processo de concepção e divulgação
de uma marca é necessário compreender o que
motiva a opção de compra e é fundamental
utilizar uma imagem (mental e simbólica), adequada
aos sentimentos do consumidor.
A marca emocional é a razão pela qual os detergentes
atuais deixam de prometer lavar bem – o que passa a
ser um dado adquirido e exigido – para oferecerem algo
mais que transita para o fator emoção, como
deixar a roupa fresca ou perfumada.
Em vez de produtos ou empresas, a marca contemporânea
passa representar um ideal de vida, um arquétipo emocional
ou filosofia de vida, na qual os consumidores revêem
os seus desejos ou aspirações, ou através
da qual podem asceder a determinado status.
A marca será o resultado de experiências
multisensoriais, de dados e argumentos lógicos ou emocionais,
oriundos da organização pelos mais diversos
meios (marca gráfica, sonora ou olfativa, da embalagem,
da arquitetura e estado dos edifícios e ambientes de
alojamento das organizações, da qualidade dos
produtos e dos serviços, da interface com os empregados,
dos anúncios e artigos de imprensa, da comunicação
institucional, das opiniões de amigos, de inimigos
e do público em geral, de rumores etc.), seja de forma
direta ou indireta, e que condicionam a construção
de um mundo simbólico partilhado. Neste sentido,
a marca aparece como um conceito, uma filosofia ou mundo simbólico
partilhado por um grupo ou como refere Maria João Vasconcelos
[4›], é
uma ideologia, uma diferença, um ser vivo, uma comunidade
e uma reinvenção constante.
Notas
- OLINS, Wally, Imagem Corporativa
Internacional. Barcelona: Editorial Gustavo Gilli,
1995. [‹ VOLTAR]
- COSTA, Joan – La Imagen
de Marca. Barcelona: Paidós Diseño,
2004. ISBN: 84-493-1531-X. [‹ VOLTAR]
- Afirmação de Joan
Costa por e-mail enviado ao autor do artigo. [‹ VOLTAR]
- MARTINS, José; A
Natureza Emocional da Marca: como encontrar a imagem
que fortalece sua marca. 4ª Ed. São Paulo: Negócio
Editora, 1999. [‹ VOLTAR]
- 14 de Novembro de 2004, em representação
da Brandia Network, "Semana Nacional do Marketing:
Marcas o 5º Poder", da APPM. [‹ VOLTAR]
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Daniel
Raposo Martins (1977) é designer de
comunicação e desenvolve atividade
profissional na área da Identidade Corporativa
em Portugal. Freqüenta cursos de design desde
1993, destacando-se a sua Licenciatura em Design
de Comunicação e Técnicas
Gráficas, Variante Design Gráfico
e Publicidade e a freqüência do mestrado
em Design, Materiais e Gestão de Produto,
aguardando defesa da sua tese com o título
"Gestão de Identidade Corporativa:
do sigo ao código". Reside na cidade
de Castelo Branco onde é professor na Escola
Superior de Artes Aplicadas de Castelo Branco,
mas foi o estado caótico da profissão
e a luta por um ideal que procura o bem comum
dos designers, que o levaram a ser membro fundador
e atual secretário de Direção
da Associação Nacional de Designers,
Portugal. |
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