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Desconstruindo imagens para construir mensagens

Márcia Okida
Novembro 2004

Título original
Citizen Kane
País / ano
USA / 1942
Direção
Orson Welles
Com
Joseph Cotten, Dorothy Comingor e eAgnes Moorehead

 

 

A desconstrução gráfica de imagens é uma maneira fácil, criativa, didática e que causa curiosidade e expectativa nas pessoas que desejam conhecer mais e profundamente as diversas áreas e linguagens do design gráfico.

Longe de ser uma área destinada apenas a artistas, publicitários, ilustradores etc., o design gráfico e suas linguagens tem se mostrado cada vez mais presente em todas as formas de expressão visual.

Durante palestras, cursos, exposições, workshops, que costumo dar dentro da área de comunicação visual, o momento de maior curiosidade e onde os participantes assimilam mais todas as linguagens invisíveis, ou seja subliminares do design, é quando se propõe a desconstrução dos mais variados tipos de criações gráficas como: cenas de filmes, cartazes, logotipos, páginas de jornais ou revistas e até mesmo de ambientações.

A idéia de descobrir o que existe por de trás de uma cena de filme, por que um determinado cartaz foi criado com uma certa disposição, ou por que uma página de jornal ou revista escolheu determinada fonte de letra e imagem para sua montagem, aguça a vontade de entender os mecanismos visuais das informações ali dispostas.

No momento em que se disseca o porquê de uma letra, se descobre suas formas, seu objetivo e sua força visual, podendo ser melhor relacionada com um público, um assunto ou o mercado.

Ao desmontarmos uma diagramação, se descobre a movimentação, linha de leitura mais forte, o tempo de fixação do olhar em determinados pontos podendo, com isso, adequar melhor a criação as características de gostos e preferências, por exemplo, de um adolescente ou um adulto.

Fazendo a leitura de uma fotografia descobrimos seu principal foco, que nem sempre é o maior e mais claramente mostrado, percebemos a força de um preto e branco ou de um vermelho e como essas forças podem mudar se estiverem um lugares diferentes. Com isso podemos escolher com certeza a melhor imagem para a mensagem textual a ser transmitida.

Aliar a criatividade à vontade de se descobrir e de criar faz com que todas as teorias de construção e linguagem gráfica e estética sejam assimiladas mais facilmente, no início com a busca da desconstrução de um modo inconsciente, para que posteriormente esse aprendizado ocorra de uma maneira natural e apareça de um modo totalmente consciente e carregado de informação no momento de uma criação.

Como exemplo, coloco a seguir uma desconstrução de um cartaz do filme Cidadão Kane onde se percebe claramente uma relação direta entre a linguagem estética do filme e do cartaz, que revela também a história base do filme. Vale lembrar que existem vários cartazes desse filme e que em todos podemos encontrar as mesmas associações.

Este cartaz traduz uma das principais características desse belo e histórico filme: a linguagem de câmera. Cidadão Kane foi um dos primeiros filmes a usar a linguagem de câmera alta e baixa para transmitir, respectivamente, inferioridade ou superioridade em suas cenas. Essa linguagem subliminar é percebida claramente em todo o decorrer do filme e também pode ser facilmente identificada nesse cartaz em vários momentos.

Uma câmera alta enquadra a personagem de corpo inteiro sobre vários jornais. A proporção entre os jornais e a personagem está exagerada propositalmente, fazendo com que a câmera alta, mais essa distorção dos jornais, ajude nessa sensação de que a mídia, a imprensa, é maior, mais forte que ele.

Já o seu nome, Cidadão Kane, nessa faixa que é amarela, é mais forte que os jornais e causa também um impacto maior do que o próprio "Kane" em vermelho, o que pode ser traduzido como: o controle das informações pode mudar rápido e facilmente de mãos. Ora o homem controla, ora ele é controlado.

Do outro lado do cartaz vemos um rosto em closed. É a imagem mais forte que temos no cartaz. Essa imagem pode representar o passado e o futuro, já que temos o rosto de Kane jovem olhando para ele mais velho, de corpo inteiro. Esse rosto, além de estar em closed parece estar sendo enquadrado por uma leve câmera baixa.

Essas dualidades todas de enquadramentos, controle de informações, passado e futuro, também estão presentes na combinação de cores desse cartaz: azul e amarelo. Azul representando calma, estabilidade e o amarelo representando ansiedade, instabilidade e poder.

Uma outra linguagem muito usada no filme e também presente nesse cartaz é a da gestalt. Essa troca entre figura e fundo que os enquadramentos e as cores obrigam os nossos olhos a fazer também existe em praticamente todo o decorrer do filme, desde o seu início onde ele ainda criança deixa de ser a imagem principal para ir ficando preso em uma moldura de janela até o seu final com o desfecho do Rosebud.

Este foi apenas um exemplo simples e já usado em alguns cursos e workshops para ajudar o entendimento e a assimilação das linguagens visuais usadas em filmes, logotipos, cartazes, revistas ou jornais.

Linguagens como a da gestalt, semiótica, geometrização visual, linha de leitura, ponto-áureo, linguagem das formas, tipos e cores, sinestesias gráficas, movimento visual, adaptação de linguagens (transferência da linguagem do cinema para o design, do teatro para o design etc.), enquadramentos, simbologias entre outras, podem ser vistas em alguns trabalhos de desconstrução que estão nesse site.

 

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Márcia Okida (1967) é designer gráfico, professora de planejamento visual na faculdade de Jornalismo disciplinas Revista e Jornal Laboratório, faz parte do grupo de professores orientadores de TCCs de Publicidade e Jornalismo e também intregra a Coordenação do curso de jornalismo na Unisanta (Universidade Santa Cecília).
 

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