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Xoc recria trilha de Super Mario em álbum não convencional

 

Por Alexandre "alexo" Maravalhas

Colaboração de Guilherme Caon

 

 

Inusitado. Seria este um adjetivo adequado para resumir brevemente uma descrição a este álbum? Não querendo ser apelativo, exagerado, incorreto ou mesmo injusto, usaria sim esta descrição – se não a todo ele – pelo menos para várias passagens deste remake da trilha sonora de Super Mario World, entitulado XOC Plays SMW, arranjado e executado pelo artista Jason Cox.

Cox (foto abaixo), 1976, é californiano e mora atualmente em Orangevale, brinca com seu próprio sobrenome assinando também com o pseudônimo "Xoc" (pode ser pronunciado como "xoac" ou como queira, segundo o próprio sugere), além de alguns trabalhos solo, toca bateria na banda Pesadillas, guitarra na Knifethruehead, entre várias outras participações.

O álbum, uma produção independente, sem fins comerciais e desenvolvida por hobbie – Cox, apesar de estar envolvido com vários projetos relativos à musica, trabalha em horário integral para o governo do seu Estado –, está disponível na internet em arquvos MP3. São 21 faixas e totalizam 26 minutos da divertida, saudosa e bem acabada remixagem de toda trilha do jogo Super Mario, para Super Nintendo.

 

"Eu acho que todos os compositores clássicos para Nintendo tinham um verdadeiro talento para manterem coisas simples e eu acho que é por disso que, depois desses anos todos, sua música ainda está na minha cabeça!"

– Jason Cox

     

Jason tem, realmente, grande mérito sob vários aspectos. Seja na liberdade criativa das releituras ou na tranqüilidade como executa suas peças mais despojadas, seja da qualidade musical imposta ao resultado final – independente da faceta bem-humorada sempre presente, o que para alguns poderia diminuir a "seriedade" da obra –, enfim, seja no acabamento e também na iniciativa como um todo. Sem esquecer de enfatizar o aspecto "banda-de-um-homem-só" do trabalho.

Mas após o elogio é necessário fazer uma outra justa reflexão. Um tipo de "ponto a favor" da qualidade que afirmo sobre este álbum reside na citação de um nome: Koji Kondo, o renomado compositor da obra original, a quem inclusive, Cox dedica esta nova roupagem. Não diminuindo alguns dos aspectos positivos já postos sobre este remix, nem querendo parecer simplista quanto à criação de rearranjos, me parece altamente inspiradora a tarefa de remontar a obra de Kondo. Especialmente a tão bem-sucedida trilha de Super Mario!

Leite, pedra e limitações

Mario Brothers e Koji Kondo. Quanto valor agregado há nestes dois nomes! Talvez duas das "marcas" mais fortes da arte na indústria do entretenimento eletrônico. Já os estou chamando de marcas? Bem, são efetivamente ícones – representam uma fatia já imortalizada do inconsciente coletivo do setor.

A obra de Kondo não é extensa; mesmo assim, sua atitude musical é fortemente expressiva, marcante e carismática. E já fez história: está presente em vários subprodutos da linha Mario Bros. e também, nada mais, nada menos que na trilha de The Legend of Zelda, outro peso-pesado dos jogos eletrônicos de todos os tempos.

A OST (trilha sonora original) de Super Mario é genialmente bem composta, adequada ao tema do jogo, amada e aclamada mesmo por não-aficionados da área. Clássica, consagrada já. O jazz original da máquina, porém, é meio mecânico, meio digital, meio duro. Talvez fosse mais correto dizer limitado em sua expressividade sonora (falo da qualidade dos timbres de sua execução em tempo real nos consoles), restrito aos poucos recursos tecnológicos dos equipamentos da época de seu lançamento. Mas ela ganha tanta expressividade nas releituras, mesmo as mais despretenciosamente construídas; se tornam sempre tão ricas musicalmente, exatamente pela força que Kondo dá a sua composição, e onde o novo artista aproveita, claro, pois deve – ou deveria – reconhecer e usufruir dessas qualidades originais.

Essas limitações artísticas e de imersão criativa (e falo das várias formas de artes aplicadas aos jogos) que acontecem em todo produto eletrônico "contemporâneo" sempre me fazem imaginar qual deve ser a frustação dos autores, criadores, em se expressar restritos e diminuídos aos moldes dos veículos de suas obras: os computadores (leia-se consoles etc.). E não nos enganemos em achar que estas foram limitações enfrentadas apenas nos tempos mais remotos da história dos jogos, pois os artistas estão sempre se expremendo, podando a riqueza da "irregularidade" de sua arte às imposições da tecnologia vigente – que é digital.

 
 
Koji Kondo, compositor da trilha original de Mario Brothers.
   

Sendo assim, acabo acreditando que as obras baseadas em recursos tecnológicos de execução em tempo real – pois são interativas – sempre levam consigo o potencial de serem maiores do que suas apresentações primeiras, ou seja, as versões OSTs – que são o destino inicial a que foram projetadas – são sempre embrionárias. Não falo da composição, pois ela existe em um momento virtual, conceitual, que é anterior à execução, portanto isenta dos tetos matemáticos dos computadores.

Este Mario, remixado por Xoc, é um exemplo disso: ele sugere várias possibilidades expressivas de uma composição, independente dos limites técnicos dos produtos interativos. Mas como, de qualquer forma, a obra musical em si só ganha força pelo sucesso do conjunto de elementos de um jogo, ela não seria o que é sem o produto Mario Bros., não adianta querermos desvinculá-la do meio eletrônico mesmo e cria-se aí um ciclo vicioso.

Sino de escola

Cox é hábil ao reapresentar a trilha de Mario sob um arranjo criativamente bem-humorado. Nas imagens da capa (outra intervenção, agora com o logotipo da BMW), que fazem parte do kit do produto digital, e que também foi criada por Jason, existe uma lista de instrumentos e sons que usou nas suas paródias. Algumas delas, para ilustrar o leitor: triângulo, porta de geladeira, banjo, xilofone, vozes, acordeon, teclados, corneta de bicicleta, baixo elétrico, guitarras, sino de escola, entre tantos outros que minha ignorância não permite traduzir, nem tentar o literal. Mas você pode tê-las todas, baixando as capas do site que indico ao final desta matéria.

 

Os vocais usados em algumas faixas do álbum – extremamente bem manejados – adicionam um agradável tom humanista à linguagem musical do trabalho. Aliás, o elemento orgânico está muito evidente no conjunto da obra, mesmo quando, explicitamente, se lançou mão de recursos eletrônicos. Esse sabor oferecido às peças, aliada à musicalidade da trilha original de Mario, torna o álbum muito vivo, muito expressivo. E é essa expressividade que me atrai muito, quando penso em música para jogos eletrônicos.

Volto aos vocais. E como sempre acabo me referindo por inusitado ao arranjo de Cox, as vozes não foram utilizadas apenas com toque adocicado, como é na maioria das aparições, mas pontualmente contrastante, ácida poderia dizer, na faixa "P Block Special Do The Mario", baseada na trilha dos créditos finais que encerram o "Super Mario Bros. Super Show", programa de televisão dos anos 80, onde Jason contribuiu aqui com mais uma performance, cantando Do The Mario.

P Block Special Do The Mario
Do the Mario!
Swing your arms from side to side.
Come on, it's time to go!
Do the Mario!
Take one step and then again,
Let's do the Mario,
All together now!
You got it!
It's the Mario.
Just like that!


Minha crítica – ou talvez nem seja uma crítica mas uma observação elogiosa até – seja na objetividade do autor nas faixas. Algumas delas são tão curtas quanto as originais do game. O álbum acaba muito rápido (e isso pode ser um bom sinal perceptivo), forçando ligar o repeat do meu WinAmp.

Mas também devo dizer que algumas faixas, precisamente coerente com o bom-humor ou com o inusitado conceitual do trabalho, poderão – se feita em audição com mais decibéis – provocar ou até irritar os parentes, vizinhos e co-ligados, fisicamente próximos e não tão preparados a estes elementos sonoros não tão convencionais. A primeira faixa (Title Screen) lhe prepara para estes novos elementos, mas é sutil. A décima faixa (Switch Palace and Bonus Game), no entanto, chega a ser um pastelão! A maioria do álbum, no entanto, e aí eu volto a questão inicial, é muito agradável. Mas mesmo com boas doses de sobriedade musical, eventual ou sutilmente Xoc insere, novamente, situações contrastantes ou cômicas.

Como já comentei anteriormente, gostaria de poder apreciar musicalmente mais do artista. Se a sua generosidade não veio tanto em forma de minutos neste álbum – talvez propositalmente –, quem sabe com outros produtos, projetos seus em andamento, como poderemos conferir na entrevista com Cox, ao final deste artigo.

Adicione este álbum a sua coleção, relembre seus momentos à frente do SNES e confira este trabalho, a meu ver, muito interessante.

Entrevista com Jason Cox


Alexandre Maravalhas – Fale-nos de quando e como começou sua relação com música. E qual é sua relação atual com ela? Que instrumentos você toca e como foi o aprendizado com eles? Você tem planos para se aproximar mais da arte musical, como por exemplo, viver profissional e unicamente da música?

Jason Cox – Comecei tendo aulas de bateria por volta de 1987, embora meus estudos formais não tenham durado muito. Eu realmente nunca me importei tanto com as aulas semanais... elas eram muito parecidas com a escola. Minha mãe, então, passou a me dar algumas aulas de guitarra em casa, e isso foi até 1990, quando comecei a estudar guitarra e piano sozinho. E foi nessa época que eu comecei a tocar bateria em algumas bandas. Sou baterista do Las Pesadillas durante quase 10 anos. Também sou guitarrista em uma banda metal chamada KnifeThruHead, como também em vários outros projetos. Torço para que algum deles dê tanto sucesso a ponto de se tornar um trabalho!


Alexo – Gostaria de ouvir seus comentários sobre a trilha original de Mario e sobre seu compositor, Koji Kondo. E por que escolheu Mario para compor este remix?

Cox – Eu acho que todos os compositores clássicos para Nintendo (Kondo, Hip Tanaka etc.) tinham um verdadeiro talento para manterem coisas simples e eu acho que é por disso que, depois desses anos todos, sua música ainda está na minha cabeça!

Escolhi Super Mario World porque ele contém muita música envolvida e são todas incríveis. Existe um tema básico que aparece em quase todas as faixas; reorquestradas e moduladas e então, embaixo dela, existem várias contra-melodias que você, muitas vezes, nem as percebe lá. Como nos 40 segundos da Underwater Theme, onde há uma melodia muito suave na versão original e eu acredito que ela deveria ser a melodia principal. Então, na minha versão, ela está bem mais evidente.


Alexo – Você pode nos falar a respeito das etapas do processo da produção deste álbum, desde a idéia, inclusive quanto tempo levou até a finalização? O que foi mais desafiador?

Cox – Todo o processo de gravação levou por volta de cinco meses porque eu não tive, desde o início, a intenção de fazer todas as músicas. Comecei fazendo só o Forest of Illusion e o tema principal. Mas gradualmente fui desenvolvendo outras, quando me ocorreu que poderia fazê-las todas!

Eu não tenho exatamente o equipamento dos meus sonhos mas trabalho muito rapidamente. Gravava a bateria para várias músicas antes, depois o baixo para um monte delas também e, eventualmente, eu deveria adicionar instrumentos aqui e lá em todas elas. A única faixa que eu fiz do início ao fim, em um dia, foi a Title Screen. Fiquei trancado o dia todo em meu quarto e comecei a ficar meio atrapalhado, o que explica os vocais esquisitos.

A coisa mais difícil foi fazer a End Credits, porque há muito acontecendo ali. Na primeira vez eu gravei dez pistas de guitarras antes de perceber que elas estavam desafinadas! Tive que excluir tudo e começar novamente.


Alexo – Que trilhas originais para jogos você poderia recomendar seja pela qualidade ou por preferência pessoal?

Cox – Tratando-se de trilha para jogos, eu acho a série Metroid a minha favorita, realmente. Mas uma outra que descobri é a Beetlejuice, um jogo para Nintendo, composta por David Wise. A música é fantástica do início ao fim e eu não acho que muita gente a conheça, pelo fato do jogo ser muito difícil.


Alexo – Sobre rearranjos para música de jogos, você tem outros projetos em andamento, ou mesmo idéias, que pudesse nos adiantar? Devemos esperar algum outro álbum de Xoc para breve?

Cox – Eu estou trabalhando em dois álbuns de Xoc neste momento. O primeiro será de músicas de jogos baseados em filmes dos anos 80. Estou com 75% deste projeto terminado. O outro álbum terá músicas da série Metroid.

Outubro/2005
XOC Plays SMW
01
Title Screen
1'20
02
Welcome Theme
0'15
03
Yoshi's Island
0'26
04
Theme Original
1'26
05
Underground Theme
1'21
06
Course Clear
0'08
07
Donut Plains
0'31
08
Ragtime Theme
1'16
09
Ghost House Secret Exit
2'01
10
Switch Palace And Bonus Game
0'59
11
Vanilla Dome
0'48
12
Underwater Theme
1'56
13
Star Road
0'49
14
P Block Special Do The Mario
2'18
15
Forest of Illusion Full Version
1'26
16
Chocolate Island
0'31
17
Castle Medley
  • Castle
  • Boss / Course Clear
  • Demolition
3'17
18
Valley of Bowser Medley
  • Entrance Appears
  • Valley of Bowser
  • Bowser Appears
  • Final Stage
1'44
19
Vacation
0'17
20
End Credits
  • Credits
  • Eggs
  • Cast
3'35
21
Death Game Over
0'20

 

Ficha técnica
  • Composição original por Koji Kondo, 1990
  • Arranjo e execução musical, voz e capa por Jason Cox
  • Editado na Optical Pies Recorders
  • Direitos reservados © 2005 Bend Over Beethoven Music
Download do álbum completo
 www.archive.org/details/xoc_SMW

  • Veja também: 
My Space de Jason Cox
Fotos da Optical Pies Recorders
Irresponsibleaudio
Banda Las Pesadillas
Banda KnifeThruHead
Super Mario World no OC Remix
 
  • Alexandre "alexo" Maravalhas (1971) é natural de Curitiba, Paraná, designer gráfico. É apreciador das artes e das interações nos jogos eletrônicos, em especial, nos últimos anos, colecionando música de games. Fundou a Benzaiten e ofereçe este espaço para enaltecer o trabalho de artistas que trabalham na área do entretenimento interativo.
  • Colaboração de Guilherme Caon na revisão da tradução do texto da entrevista, feita originalmente em inglês.
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Colaboração: Jean Escoto | Hospedagem: Hugo Cristo