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Come-Come pré-histórico

 

Por Alexandre Maravalhas

 

Como é valiosa a concepção de algo original! Que horizontes se criam e que caminhos serão desbravados a partir dela? Como mensurar o impulso no indivídio e a dinâmica na coletividade ao vivenciar algo inesperado? Ou aquele sentimento de afinidade, que no primeiro contato com o novo, este parece ser tão simples e ao mesmo tempo completo, que o próprio observador, com alguma prepotência talvez, sinta-se co-autor do objeto admirado. Não é incomum a expressão: "Isso até eu faria", o que garante, na boa ótica, competência de seu criador, tamanha empatia conquistada.

 

Exemplos assim podem ser constatados em exposições de obras de arte ou em projetos de design, ao presenciar determinado grau de inovação. Afinal, poderão ser tantos os desdobramento pós-criação, tal qual o teor de inovação que o objeto traz em sua categoria, avaliação que será intimamente relativo ao momento histórico em que foi inserido. E se tratando de produtos onde o meio eletrônico é seu suporte, de um lado, aqueles que eram inovadores tecnologicamente causaram entusiasmo; de outro lado, de um ponto de vista distante, décadas mais tarde, o recurso técnico é ridículo se comparado com o mais despretencioso produto de entretenimento interativo atual, restando uma abstração sobre a concepção intelectual. Ambos os aspectos, sejam de solução técnica ou de criatividade são importantes. Cabe então, o olhar atento e respeitoso aos estudiosos e profissionais da história recente, que desbravaram esse terreno tão fértil quanto restritivo expressiva e funcionalmente, responsáveis por momentos tão produtivos no âmbito da concepção de jogos.

O título deste rascunho tem oportunamente duplo sentido, mas que se relacionam entre si e têm relevância com a abordagem da matéria. De um lado, uma reflexão sobre o conceber, seus valores, suas possibilidades de releituras e a posteridade e de outro, rápida análise de um produto eletrônico. Estamos falando do clássico Pac Man (ou o nosso Come-Come), mas também podemos estender a relação a qualquer outro produto de época relativamente inovador, seja no conceito, na mecânica ou na tecnologia. Por fim, uma exposição sobre um segundo produto, que explicitamente apresenta referências ao primeiro, fechando o ciclo.

Pac Man: quem não conhece?

O primeiro jogo eletrônico – o "Tennis For Two" – foi desenvolvido em 1958 por Willy Higinbotham, um físico que trabalhava no Brookhaven National Laboratories, em Nova Iorque. Desde então, relata-se muitos eventos históricos, como o desenvolvimento do "Space War" no MIT (Massachusetts Institute of Technology), a concepção e patente do console nos moldes atuais e o jogo Pong (por Ralph Baer, em 1968) até o surgumento do primeiro console caseiro, o Odyssey 100 (pela Philips), em 1972, entre tantas outras evoluções.

No Brasil, o primeiro videogame foi lançado em 1977. Era o Telejogo, comercializado pela Philco e que dispunha de apenas três jogos fixos. Nessa mesma época nos EUA, estava sendo lançado o Atari Video Computer System, o videogame que se tornaria o mais popular de todos os tempos. Por volta de 1980, quando os consoles caseiros já eram produtos bem mais consistentes e acessíveis, surgiram jogos que seriam referência e influenciariam a história dos games por muito tempo. Falamos de títulos como: Donkey Kong, Tron, Space Invaders, Missile Command, Soccer, Moon Patrol, Defender, Berzerk, Zaxxon, Centipede, Xevious, Defender, Polaris, Rally X, Frogger, Galaga, Asteroids, Mr. Do, Q-Bert, Popeye. Quem não conhece alguns ou vários destes nomes? A popularidade dos produtos da época de ouro do videogame é até hoje muito marcante e para Pac Man a história reserva lugar privilegiado.

Em 1955 Masaya Nakamura cria a Namco – Nakamura Manufacturing Company – empresa que no início de suas atividades construía carrosséis e que só em 1979 criou Galaxian, seu primeiro jogo. Em 1980 a Namco lança o Pac Man, um dos precursores de jogos de labirinto e um dos mais populares produtos da indústria do entretenimento de todos os tempos. Até hoje, mais de vinte anos depois, Pac Man ainda é um produto comercialmente ativo.

 

Numa época com tantos de jogos de tiro (shoot'n up), o designer Toru Iwatani visualiza um produto simpático, de estilo cartum, que não tivesse apelo tão masculinizado, mas que também fosse acessível ao público feminino. Nas idéias iniciais para o projeto, Toru buscou a referência na própria lingugem: primeiro na palavra japonesa "taberu", em kanji, que significa "comer". Depois, o caractere japonês referente a "boca" (kuchi) é de desenho circular. Ainda, a gíria "paku paku", que significa o som do mastigar e a inspiração em uma pizza sem uma fatia na lanchonete ajudaram a conceber a história, que se chamaria Puckman, nome de "batismo" que foi logo alterado para o imortal título de Pac Man, produto que no Brasil também é conhecido por Come-Come.

Descrever o jogo é simples. Seu personagem faminto encontra-se em um labirinto e deve comer todas as "bolachinhas" sem ser pego pelos fantasmas que rondam o local. Dispostos nos cantos, quatro "super-bolachas" lhe dão poder temporário contra seus inimigos. Terminada a comilança, recomeça em etapa mais avançada. O sucesso de Pac Man também vem da simplicidade do seu mecanismo e da simpatia de seus personagens. A primeira versão, para arcades (máquinas individuais para locais público de jogos), demorou mais de um ano no desenvolvimento.

Pac Man, como qualquer clássico, foi adaptado para várias outras plataformas (computadores, videogames e portáteis) e teve algumas continuações oficiais, como Ms. Pac Man, versões "remixadas" como Pacmania, além de muitos clones e produtos inspirados em sua funcionalidade ou indiretamente em jogos de labirinto ou de outra categoria.

Originais,
continuações
e inspirações
Algumas versões originais, outras seqüêcias e ainda, as que, ao adotar a mesma funcionalidade do e Pac Man tradicional, acabam se tornando "clones", umas com temáticas diferenciadas, outros com a inclusão de novos elementos acessórios.

 

Clique nas telas para ver ampliadas.

   

Nova roupagem, temática das cavernas

Avançamos o calendário para 1990. Temos na outra ponta desta matéria a releitura: Trog – desenvolvido pela Midway – essa irreverente versão de jogo de labirinto, inspirado em Pac Man. O produto inicialmente projetado para arcades, transforma "come-come", pastilhas e fantasmas em dinossauro, ovos e homens-das-cavernas! Em geral, Trog pode ser visto como um clone moderno de Come-Come, com temática diferenciada e alguns aditivos interessantes, mas funcionalidades bem similares ao original, o que torna a experiência até mais afinada (principalmente para quem viveu a época preciosa do game original).

Em um passado distante, na terra de OG vivem trogs, os inventivos homens pré-históricos de um olho só. Nesta terra também habitam dinossauros famintos e essa é a história de Rex e seus amigos dino: Bloop, Spike e Gwen. Na eterna busca por comida, os dinos têm a árdua tarefa de disputar o terreno confinados aos limites de pequenas ilhas, enfrentando quatro categorias de trogs caçadores: marrons, vermelhos, azuis e verdes, cada um deles com uma especialidade. Rex e seus amigos precisarão de sua ajuda para coletar alimento, pois os trogs, além da constante inspiração para criar utensílios de caça, também são conhecidos por seu apetite, pondo em risco a vida dos amigos.

Ajude o pequeno T-Rex nessa corrida pela sobrevivência, escapando dos perigosos trogs que estarão sempre criando novas armadilhas para nossos pequenos glutões. Procure os alimentos que darão um aditivo vital a eles e, ao final de toda a comida da ilha, você finalmente poderá voltar para a casa.

 

A companhia Midway usou técnica de animação que chamou de PLAYmation, com gráficos previamente calculados (renderizados). A qualidade de vídeo na versão para arcade é de 396 x 256 pixels, com paleta de 256 cores, imagem que era apresentada em um gabinente de monitor de 25 polegadas.

Várias e importantes mudanças estratégicas na funcionalidade e jogabilidade do produto aconteceram desde os protótipos até a versão final. Inicialmente, a proposta de Trog era ser um jogo de estratégia, mais que de ação em si. Nessa concepção preliminar, o jogador não controlava o próprio personagem diretamente, mas indicava a ele o melhor caminho (telas 2 e 3). Na verdade, a interação do jogador era em estabelecer uma trajetória, como quem altera os caminhos do labirinto, conduzindo o personagem.

1.
Tela inicial do jogo.
2 e 3.
Telas de tutorial das versões protótipo.
   

Na fase de testes dos protótipos, ficou claro que esse método era um tanto confuso, onde a decisão no aumento de jogabilidade alterou a forma de condução do jogo, muito mais convidativo, informação que foi confirmada por pesquisas em tempo de projeto. Por questões orçamentárias e de investimento inicial, o game passou a se tornar, assumidamente pelos projetistas, um ´clone´ do Pac Man, quando elimina grande parte do aspecto estratégico.

Já no formato definitivo, não é difícil explicar o jogo. O cenário, que é representado por ilhas, é repleto de ovos e outros alimentos especiais, com efeitos diferenciados no personagem. Aparecem no terreno trogs e dinos: é possível a ação cooperativa dos quatro amigos simultaneamente (tela 5). Objetivo: comer todos os ovos do local, fugindo dos caçadores para voltar para casa, encerrando assim, cada fase (tela 6).

4.
Nível de dificuldade
5 e 6.
Telas dentro do cenário de jogo
 

Os aditivos do jogo ficam por conta da evolução da invenção dos trogs na caçada, como: habilidade com a clava, escavação de fosso, fogueira e outros aparatos e também pelo recurso energético de alguns alimentos, como a planta vermelha que deixa nosso dino-mite mais veloz, a pimenta que dá um "hálito de fogo", portas de transporte entre outras opções. Apesar dos socos que podem atordoar ou, em seqüência, fazerem voar longe um trog, é importante conhecer todas as vantagens, como por exemplo, o abacaxi que temporariamente desperta o animal dentro de nosso jovem esfomeado. Dinos e trogs não sabem nadar, portanto respeite os limites da natureza não caindo das beiradas da ilha.

Trog, afinal, é uma releitura bastante divertida e bem produzida, com bons gráficos, animação bem cuidada, personagens expressivos, música e efeitos sonoros cômicos e boa jogabilidade. Peca, talvez, pela falta de cenários mais diversificados ou dinâmicos, além do esquema retangular da maioria das fases, o que deve ser até analisado pelas restrições tecnológicas da época. Mesmo assim, garante bos tiradas e diversão acessível, até mesmo em homenagem à memória do inesquecível Pac Man.

SETEMBRO/2003
 
     
Produto
Trog
Plataforma
Arcade
Fabricantem, ano
Midway, 1990
Game design
Jack E. Haeger
George N. Petro
Arte e animação
Jack E. Haeger
Música e sons
Chris Granner
Software
George N. Petro
Kurt Mahan
Hardware
Mark Loffredo
Glenn Shipp
Cary Mednick
Al Lasko
Raymond Gay
Sheridan Oursler
Design do gabinete
Ray Czajka
Arte-final do gabinete
Linda Deal
Jack E. Haeger

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Retrospace
  • Alexandre "alexo" Maravalhas é de 1971 e, embora não tenha vivência ostensiva em produtos de videogame, acaba assumindo que é de sua época vários clássicos como Pac Man, Enduro, Moon Patrol, River Raid ou Pitfall. Singelamente também pretente com esta matéria homenagear os criadores e profissionais empenhados na área de entretenimento eletrônico.
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Colaboração: Jean Escoto | Hospedagem: Hugo Cristo